segunda-feira, 6 de maio de 2013

Artigos de Opinião | Ludo Martens - Tian An Men | 1989 | Do Desvio Revisionista à Revolta Contra-Revolucionária (II)




A Preparação Sistemática da Violência

Se é indiscutível que a maioria dos estudantes não desejavam violência, é também evidente que a direcção do movimento, desde o início e de forma sistemática, preparou os a situação para um confronto violento.

A 21 de Abril de 1989 faz-se, a partir da Universidade de Beida, um apelo à greve. “Queremos fazer progredir a democracia pela sinceridade do nosso sacrifício, pouco importa a repressão, escalaremos montanhas de laminas cortantes, nós submergiremos em oceanos de fogo!”[1] , é uma linguagem que chama ao sangue.

Outro jornal de 23 de Abril segue textualmente a propaganda de Taiwan: “a democracia e a liberdade é o fim de nossa greve. A luta é inevitável, temos de aceita-la sem temor. Haverão vitimas, porém o sacrifício vale a pena. Podemos aceitar a dor de ter nascido na escravidão? Nascemos livres, eles querem fazer-nos escravos.”[2] É uma táctica posta em prática desde há muito tempo pela CIA para a luta nos países socialistas: evitar por tanto tempo quanto seja possível o confronto directo com os órgãos da ditadura do proletariado; ganhar uma vasta influência entre as massas menos conscientes proclamando a sua vontade pacifista; preparar psicologicamente o confronto inevitável para, finalmente, destacar que as autoridades puseram em marcha a agressão e que os manifestantes têm direito à legitima defesa.

A 13 de Maio, os dirigentes decidem dramatizar a luta começando uma greve de fome de 3.000 estudantes. Preparando o confronto, falam cada vez mais frequentemente da morte. Na petição da greve de fome, os estudantes da universidade de Pequim falam do momento crucial, de vida ou morte, que decidirá a sobrevivência ou o naufrágio da nação. “A morte não é nosso fim. No entanto, se a morte de uma pessoa pode melhorar a vida de muitos outros e conseguir uma nação próspera e poderosa, então temos o direito de actuar vilmente.”[3] Um professor chinês de inglês explica a um jornalista do Libération a táctica seguida pelo movimento. “A direcção do Partido Comunista deve, primeiro, reconhecer a associação de estudantes e a legitimidade do nosso movimento. Contudo, estas são apenas as nossas primeiras exigências. Devem abandonar a praça. E se utilizam a violência, acontecerá na China o que se viveu na França de 1789, a tomada da Bastilha.”[4]

A 22 de Maio, os estudantes da Praça TianAnMen elevam ainda mais a tensão. “Li Peng e Yang Shangkun deram um golpe de Estado contra-revolucionário. Destituíram o secretário-geral Zhao Ziyang. Todo o povo deve esmagar este golpe de Estado e rechaçar o governo de Li Peng.”[5] Esmagar um golpe de Estado contra-revolucionário: é possível fazê-lo de forma gentil e pacífica?

Na terça-feira, 30 de Maio, uma bandeira ondula sobre a Praça TianAnMen: “o 1789 da China”, abertamente apelando a uma revolução para derrotar o regime. Wang declara a um jornalista do Libération: “a história prova que não se pode conquistar a liberdade sem o recurso à violência. É lamentável, mas o sangue tem de fluir. Na China não chegou ainda o momento. A violência vai-nos afastar das massas. Primeiro temos que despertar o povo e ganhar o seu apoio para a causa da democracia.”[6]

Às 21 horas do dia 3 de Junho, antes da intervenção das forças de ordem, quando Chai Ling pede aos estudantes da praça que levantem a mão e jurem: “pelo progresso do nosso país até à democracia, pela prosperidade de nosso país e para impedir que um milhão de chineses morram na guerra, juro proteger a Praça TianAnMen e a República com a vida. As nossas cabeças podem ser cortadas e podem derramar o nosso sangue, mas a praça do povo não se pode perder. Estamos prontos para brigar até o fim até o último de nós.”[7]

Os pacifistas: “Sabemos que deve correr sangue!”

Encontramos uma discussão extremamente significativa e reveladora do “carácter pacifico” do movimento, na revista Problems of Communism, publicada pela Agência de informação do governo norte-americano. Prova, indiscutivelmente, duas coisas. Primeiro: a opção não violenta do movimento de Pequim era uma simples táctica, uma manobra inteligente para recolher um apoio tão grande quanto fosse possível para as actividades e as teses anti-comunistas. Em segundo lugar: há uma divisão de papeis. Enquanto as vozes “oficiais” cantavam a não violência, elementos “especializados” estavam preparados para a violência. Isto é o que diz a revista do governo norte-americano a propósito da “acção sem violência” destes dirigentes estudantes tão inocentes: “Considerações de tipo prática aconselharam uma aproximação não violenta. O regime comunista, todavia controla forças militares e policiais impressionantes. O exército e as forças da policia mantiveram-se firmemente do lado do regime. Seria uma ilusão para o movimento democrático reunir-se nas montanhas como fez Mao nos anos trinta. Os democratas dizem que se a violência tem um papel no futuro da China, terá que vir do interior do exército chinês. O presidente da Primavera da China, Hu Ping, disse no Quarto Congresso da organização em Los Angeles: “A nossa organização não tem força para dar um golpe militar”. Wan Runnan, da Federação Democrática afirmou: “O nosso principio da acção sem violência não significa que o sangue não correrá. Há uma divisão de papeis. O nosso papel é organizar actividades agradáveis, racionais e não violentas. Porém, outros cumprirão outros papeis.” A acção sem violência e o apoio ao socialismo oferecem as melhores possibilidades para construir uma grande coligação contra o regime e para atrair ao máximo o apoio oficial e não oficial no estrangeiro. Um dirigente da Primavera da China declarava no momento dos debates do Quarto Congresso: “só a bandeira dos métodos pacíficos pode reunir uma audiência ampla e plural. Se alguém aqui me pedisse dinheiro para espingardas, daria certamente as espingardas para a caça de aves.” [8]

Os amotinados atacaram primeiro

Quando o exército e a policia quiseram reestabelecer a ordem, depois de duas semanas onde tentaram explicar a situação aos estudantes e dissuadi-los, os primeiros feridos e também os primeiros mortos, caíram do lado do exército.

O jornal Libération descreveu os acontecimentos e sexta-feira, 2 de Junho, nestes termos: “as massas lançaram-se sobre os militares, a imensa maioria muito novos e sem armas. Milhares de soldados foram feitos prisioneiros. O seus oficiais ordenavam que não resistissem.”[9] No sábado, 3 de Junho, às 15 horas, o jornalista do Libération anotou que manifestantes atearam fogo a veículos militares. E continua: “armas, recolhidas de um dos veículos, apresentam-se. Pequim tinha já, esta tarde, um ar de motim.” “Sem violência não podemos conquistar mudanças. Devemos preparar-nos para isso. Não tememos a violência”, grita um operário. Esta violência já está no ar. No sábado, às cinco da tarde, no Palácio do Povo, jovens patrulham com pedras e largos cacetes recolhidos das mãos dos policias. “Estamos preparados para o sacrifício”, clama um orador improvisado. Se cai um de nós, serão um milhão os que se levantam”. As massas gritam: abaixo o regime fascista! Cada vez mais gente fala de “responder à violência do Estado.”[10] Lemos em Le Soir: “ao redor de quilómetros, tanto no oeste como no este da Praça TianAnMen, a avenida Chang’na não é mais que uma sucessão de barricadas.”[11] O jornal de direita The Far Eastern Economic Review escreve: “Na tarde de 3 de Junho, uma nova intervenção de soldados a pé e desarmados foi parada diante do Hotel de Pequim, porém desta vez, alguns soldados são agredidos brutalmente por bandos de jovens criminosos que apareceram pela primeira vez na Praça TianAnMen com barras de ferro e cassetetes. Durante vários incidentes, vários soldados perderam a vida, agredidos a murro e pedras. Em Chong Wen Men, o corpo de um soldado foi queimado. Num outro incidente, manifestantes mutilaram o corpo de um soldado.”[12] Um cidadão belga em Pequim declara por telefone: “primeiro enviaram os tanques do 38º Exército contra os ocupantes de TianAnMen. Procuraram que não houvesse violência. Não conseguiram, houve mortos nas suas fileiras.”[13]

Quem são estes grupos de assassinos? Johan Galtung examinou os vídeos da violência e escreveu: “movem-se rápido e muito, lançam coquetéis molotov, sabendo exactamente como destruir um veiculo, até um tanque. Aparentemente, têm uns trinta anos.”[14] Podemos razoavelmente pensar em agentes vindos da Formosa, essa base mundial de esquadrões da morte, agentes que podem actuar desde há muito tempo graças à passividade e à tibieza do governo, e têm um papel importante nesta violência. À Formosa interessa que o movimento termine violentamente e ela tem os meios para realizar as provocações necessárias para este fim.

Empurrados deliberadamente para a morte?

Até um jornal tão anti-comunista como o Libération, se viu obrigado a sugerir as hipóteses segundo a qual os dirigentes do movimento estudantil provocaram deliberadamente o fim violento de um movimento que sabiam perdido. O Libération cita um dirigente ligado ao Ocidente, Lao Um: “duas semanas antes da matança, sabíamos que tudo estava perdido e Wang Juntao obrigou a preparar documentação falsa para assegurar a fuga dos intelectuais e de alguns estudantes que dirigem o movimento, entre os quais estava eu.” O Libération formula a pergunta necessária: “Por que Wang Juntao se opôs à evacuação de TianAnMen, enquanto as informações comunicadas aos activistas pelo jornalista Dai Qing, alguns dias antes, falavam de uma iminente e indiscriminada intervenção militar? Alguns dirigentes do movimento consideravam que um mártir serviria melhor a causa?” “Toda a estratégia do movimento se baseou na busca de um mártir”, reclamava recentemente um dos lideres da rede democrática.[15]

O exército tinha a obrigação de acabar com o motim

A 4 de Junho, era urgente para o exército intervir para encerrar aquelas provocações assassinas e a ocupação da Praça TianAnMen.

Desde o 1 de Junho, A Voz da América informava sistematicamente que unidades do exército estavam a ponto de enfrentar-se entre elas, que os soldados se negavam a impor a lei marcial, que o governo não contava com nenhum apoio. Noutras palavras, a emissora de rádio da CIA incitava abertamente à insurreição.

O exército não podia eclipsar-se perante a violência e os assassinatos, tão pouco podia permitir que os anti-comunistas continuassem a ocupação do coração da capital. Isto seria considerado por todas as forças anti-socialistas como uma expressão da impotência do exército perante as forças da contra-revolução, como um indicador da paralisia e da debilidade do governo e que este podia ser derrubado.

A intervenção do exército para por fim ao motim anti-comunista tornava-se necessária, contudo, constituía, ao mesmo tempo, a prova do fracasso de certa política. A orientação pró-capitalista, ou, pró-imperialista de Hu Yaobang e de Zhao Zhiyang provocam um descontentamento justificado na população, criando uma grande confusão política. Não compreendendo o alcance do programa do núcleo duro de TianAnMen, uma parte da população de Pequim opõe-se à intervenção do exército.

Para combater a violência justificada com que o país socialista se defende contra o imperialismo, os piores fascistas juram pelo humanismo e o humanitarismo. Isto demonstra que quando uma força política começa a falar de humanismo é necessário fazer sempre uma análise de classe. O porta-voz do governo fascista da Formosa, no que respeita às ingerências norte-americanas na República Popular da China, comentam: “os Estados Unidos provaram que eram dignos de ser os dirigentes do mundo livre ao manter bem altos os princípios do humanismo e dos direitos humanos.”[16] Agora, nos primeiros meses de 1990, em El Salvador, grupos fascistas enviados pela Formosa, bombardeiam cegamente os bairros populares da capital, massacrando a população. Em visita à Formosa, a 21 de Fevereiro deste ano, o presidente de El Salvador, Christiani, declarou: “Juntos marchamos pelo caminho da liberdade e da democracia.”[17] No momento da agressão contra o Panamá, um Estado independente, os Estados Unidos mataram, segundo Eduardo Galeano, 7.000 pessoas. Todos os crimes inqualificáveis do imperialismo, são sistematicamente apagados da memória de nossos povos, enquanto a repressão justificada dirigida contra a sublevação imperialista, em Pequim, é recordada pela BBC, diariamente, semana após semana desde há mais de um ano, contra o maior crime contra a humanidade. Não podemos estar ao lado dos povos de El Salvador, da Guatemala, de Granada, do Panamá, da Argentina, das Filipinas, povos aterrorizados pelos Estados Unidos e pela Formosa, e não estar do lado do governo socialista chinês que combate as tentativas de reconquista da China por parte da Formosa e dos Estados Unidos.

A China numa encruzilhada

Como pensar o futuro deste país imenso que é a China Popular, um ano depois da repressão do motim contra-revolucionário de Pequim?

Hoje, existe o risco que a agitação contra-revolucionária se levante de novo e existe também o perigo que a linha revisionista e pró-capitalista tome a direcção do Partido Comunista Chinês. Se dessa maneira a direita pode minar o interior do Partido para depois o desvirtuar, a China submergirá num caos catastrófico que, em alguns anos, custará a vida de milhões de pessoas.

A China poderá evitar este cataclismo se a correcção, a rectificação e a revolucionarização do Partido Comunista continuar até o fim. Só o socialismo pode salvar a China e só o Partido Comunista pode dirigir a construção socialista. A história recente tanto da Europa de Leste, como da China, diz-nos que nos países socialistas existem dos tipos de luta de classes.

Uma contra os reaccionários, os elementos inimigos do socialismo, os agentes do imperialismo. E outra, que tem lugar no interior do Partido para a conservação da suas tradições revolucionárias. Esta luta pela revolucionarização constante do Partido, esta luta contra as tendências da degeneração é sem duvida, a mais complexa, porém também a mais cruel.

Nós estamos em desacordo com os que fazem da luta pela “democracia” a questão essencial. O exemplo de TianAnMen demonstra claramente que a palavra “democracia”, supostamente acima das classes é utilizada para propagar o desenvolvimento livre de toda a classe de organizações anti-socialistas e pró-imperialistas. Assim, a “democracia” é a consigna na Formosa e significa, nestes casos, que o partido fascista Kuomintang tem tanto direito à participação activa e constante como as massas populares na edificação do socialismo, na sua defesa e no aperfeiçoamento do seu sistema político e económico. O desenvolvimento da democracia socialista está condicionada pela revolucionarização do Partido. Um elevado grau de democracia socialista depende do trabalho exemplar dos comunistas, dos seus laços com as massas, do seu estilo de vida simples e da luta dura, do seu espirito de sacrifício, da sua fidelidade, não em palavras mas em feitos, ao marxismo-leninismo e da sua capacidade de centralizar todas as ideias progressistas das massas.

Porém o Partido cometeu erros...

Objectam-nos, em certas ocasiões, que o Partido Comunista Chinês cometeu erros e falhas. Isso é evidente. Porém, quais são as conclusões que se retiram destas considerações? Situar-se no campo da contra-revolução e do revisionismo é a cura para a enfermidade do socialismo? Todas as correntes demagógicas acentuaram sempre os erros e as debilidades do Partido, para impulsionar as concepções anti.socialistas e contra-revolucionárias.

Os que apoiaram os heróis da Praça TianAnMen puderam agora constatar que apoiaram uma direcção ferozmente anti-socialista e pró-Formosa. Os que apoiaram o moderado, o reformador, o homem que das provas da sua flexibilidade e da sua vontade de diálogo, Zhao Zhiyang, vêem hoje que apoiaram uma linha política de privatizações e mercado livre. Lutar contra os erros e as debilidades do Partido de um ponto de vista revolucionário, e lutar pela depuração do Partido dos elementos burgueses, oportunistas, burocráticos e podres, é lutar pela conservação dos princípios marxista-leninistas e pelo seu desenvolvimento.

Gerontocracia positivo e negativo

Os eventos na China mostraram-nos, mais uma vez, que sob o socialismo a luta de classes no partido é extremamente complexa. É necessário adoptar uma atitude de estudo de pesquisa e análise para encontrar verdadeiros interesses de classe que estão por trás de algumas proposições tentadoras.

Queremos desenvolver esta ideia, tomando o exemplo de demagogia da imprensa burguesa contra a gerontocracia, o despotismo dos velhos conservadores corruptos opostos à juventude democrática e desinteressada.

Primeiro, na China, entre a velha guarda do partido, alguns são de direita, esquerda e centro. Vamos começar à direita. Num documento do Partido Comunista Chinês, em 1984, podemos ler: "Há um pequeno número de antigos membros e funcionários que não é capaz de respeitar os princípios do partido. Quando encontram uma tendência doentia, seguem-a". "No momento que se comprometeu a discutir a abertura para o mundo exterior, algumas pessoas do governo e do Partido foram atraídas como abelhas pelo mel”.[18] na luta no seio do Partido, estes velhos defendiam as posições de Hu Yaobang e de Zhao Zhiyang e nem o imperialismo da Formosa se inquietou pela sua idade, já que lutavam pela boa causa, a mesma que destes bons velhos: o papa de Roma, Ronald Reagan e Willy Brandt.

Pelo contrário, Deng Xiaoping era, aos olhos do Ocidente, o protótipo do velho tirano e retrograda. E, contudo, quando Deng apoiou a política revisionista de Hu Yaobang e de Zhao Zhiyang, o Ocidente não o poupou por isso. Deng defendeu a política nefasta de Zhao Zhiyang até Abril de 1989. E até ao momento do início do movimento estudantil, a imprensa do Kuomintang manteve a esperança que Deng se posicionasse ao lado da reforma e da democracia. Uma revista da Formosa escreveu: “o lugar de Deng na história depende desta decisão”.[19] Durante dez anos, o velho Deng manteve uma posição centrista, ainda que inclinando-se mais para a direita.

Outros velhos, como Chen Yun e Li Sien, criticaram durante muitos anos vários aspectos da política de Deng Xiaoping. Fue Chen Yun foi o que mais fortemente combateu a orientação para o mercado livre e o abandono da planificação. Também é – e vale a pena assinalar, já que Chen Yun representa, aos olhos do imperialismo, aos conservadores e corrompidos – quem com mais constância criticou todos os casos de corrupção no seio do Partido.

Resumindo, a luta de classes afecta tanto os velhos como os jovens, a população e o Partido. Portanto, é preciso analisar a fundo a coerência das diferentes correntes políticas.

A direita pró-imperialista foi derrotada na China

Quais as conclusões que podemos tirar dos meses da confrontação política em Pequim? A luta de classes que se desenvolve na primavera de 1989 acabou numa importante derrota para a direita pró-capitalista do Partido Comunista Chinês. Juntamente com Zhao Zhiyang, foram depurados toda uma serie de intelectuais de direita e de extrema-direita, como Yan Jiaqi.

No seu conjunto, a actual direcção situa-se mais à esquerda. Esta situação verifica-se, primeiro, no campo político e ideológico:

Há uma nova consciência do perigo da subversão e da infiltração, organizadas a grande escala na China pelo imperialismo e pela Formosa. O Partido Comunista retomou a concepção de Mao segundo a qual a luta de classes continua sob o socialismo, assim como persiste o perigo de uma restauração capitalista. Dentro do Partido Comunista Chinês, a capitulação ante o imperialismo. O Partido põe em primeiro plano o trabalho político e ideológico como principio directivo. A necessidade dos intelectuais se fundirem com os camponeses e operários é reafirmada. Alguns redescubriram as obras de Mao Tsé-Tung, numa tentativa de compreender as características da luta de classes.

No campo econômico também encontramos alguns novos acertos:

A planificação socialista recuperou o seu papel, importantes fundos são destinados à agricultura, o desenvolvimento da empresa privada foi retido, a campanha contra a corrupção e contra as desigualdades fortaleceu-se.

A importância da informação:

Entretanto, a luta é complexa e o seu desenvolvimento incerto. É importante seguir os debates e analisar os pontos de vista diferentes que se manifestam no seio do Partido Comunista Chinês. Queremos sublinhar a importância de obter informação de primeira mão sobre as posições dos comunistas chineses. É preciso dizer que o desprezo de numerosos progressistas ocidentais pela experiência socialista de mil milhões de pessoas é simplesmente escandalosa. Os que nem sequer se dão ao esforço de ler os documentos do Partido Comunista Chinês, mantêm fixas, com absoluta arrogância, as suas críticas e receitas infalíveis para salvar o socialismo chinês. A mais elementar honestidade intelectual obriga-nos a seguir com atenção e interesse as publicações chinesas. Ali encontramos tanto analises pertinentes como teses discutíveis e, também, pontos de vista revisionistas. Informar-se objectivamente sobre a política do Partido comunista é instrutivo em si mesmo. Nem estamos obrigados a emitir um juízo sobre todas as medidas e todas as teses nem devemos mudar as nossas opiniões demasiado rápido e de forma categórica.

O Futuro da China é incerto

A partir de 1986, certos especialistas norte-americanos consideravam que na China se chegava a um ponto em que não havia mais retorno e no qual a restauração do capitalismo era inevitável. As descolectivizações no campo, o desenvolvimento da empresa privada, a autonomia das empresas, o nascimento de uma classe tecnocrata influenciada pelo modelo ocidental, as zonas económicas especiais, o investimento estrangeiro, tudo isto, diziam, constituía uma base solida para o capitalismo. Certos revolucionários consideravam que Deng Xiaoping concluirá a restauração do capitalismo na China. Porém a mudança na orientação política e económica, depois de Junho de 1989, demonstraram a prematuridade destas conclusões.

Poderá o Partido Comunista Chinês continuar durante muito tempo os seus esforços de rectificação e aprofundar as suas críticas sobre os erros cometidos?

Os especialistas na China lançam varias hipóteses sobre o futuro.

Alguns crêem que os revisionistas no Partido utilizaram um discurso “mais à esquerda” aguardando o surto de graves problemas económicos e sociais para voltar ao poder.

Outros consideram que a rectificação política e ideológica actual será superficial, que o burocratismo, a corrupção e o parasitismo continuaram difundindo-se e que o processo de putrefacção prosseguirá, como se vem verificando desde 1978. Que os acontecimentos de Junho de 1989 seriam apenas uma pausa na marcha para o capitalismo.

A terceira escola pensa que Deng Xiaoping vai virar-se de novo para direita e apoiar outra tendência na linha da de Hu Yaobang e Zhao Zhiyang. Recordando que em Fevereiro de 1989, Deng ainda afirmava que o Partido não cometia erros importantes desde 1978. Esta escola pensa que Deng regressará a uma linha de reformas de tipo capitalista.

Estas três hipóteses falam de uma vitória final das tendências revisionistas na China.

Outros especialistas prevêem um surto na China sob a pressão de terríveis problemas económicos, sociais e demográficos, pelo crescimento dos particularismos provínciais e pela acção das forças contra-revolucionárias e pró-Formosa. A China conheceria então uma nova era de guerras civis devastadoras cuja saída seria imprevisível.

Finalmente, podemos considerar que a direcção actual do Partido conseguirá fazer uma síntese entre os princípios políticos correctos que Mao elaborou no momento da Revolução Cultural e a política económica mais flexível posta em prática desde então. Assim, a China poderia encontrar um novo dinamismo tanto no domínio político como no económico.

Uma confirmação de certas teses de Mao Tsé-Tung

Durante a Revolução Cultural, Mao Tsé-Tung não utilizou os métodos adequados para resolver o problema da degeneração capitalista, ainda que tenha abordado correctamente um problema crucial. A evolução política dos últimos dez anos confirmou amplamente algumas das suas analises.

Mao disse: “se nos afastarmos das massas, se não nos esforçarmos para resolver os seus problemas, os camponeses levantarão as suas foices, os operários saírão à rua para manifestar-se, os estudantes provocarão distúrbios. Hoje, existe gente que crê que com a conquista do poder do Estado se pode descansar em paz e até agir como um tirano. Se se encontram com as massas que lhes recebem à pedrada ou a golpes de foice consideram que não merecem isso e sim aplausos. Não podemos deixar-nos contaminar por esse estilo de trabalho burocrático, que forma uma casta aristocrática apartada das massas.” “No passado, levámos a luta ao campo, ás fábricas e aos meios culturais, empreendemos o movimento educativo socialista, sem chegar por isso a resolver o problema; porque não encontrávamos a forma de mobilizar as massas em todos os campos, a partir da base, para que denunciassem o nosso lado negativo.”

A sociedade socialista abarca um período bastante largo no qual continuam a existir as classes, as contradições de classe e a luta de classes, ao mesmo tempo que há uma luta entre a via socialista e a via capitalista e o perigo de uma restauração do capitalismo. É necessário compreender que esta luta será longa e complexa, redobrar a vigilância é procurar a educação socialista. Têm de se resolver correctamente os problemas relacionados com as contradições de classe, distinguir as contradições entre nós e o inimigo, e as contradições no seio do povo, e depois procurar uma solução justa. Se não for assim, um país socialista como o nosso passará a ser o contrário, mudará de natureza e começará a restauração capitalista.”

No XI Congresso do Partido Comunista Chinês, Hua Kuofeng explicou um principio essencial avançado por Mao: “Ap afirmar que a burguesia existe no Partido Comunista, o presidente Mao queria dizer que existem membros que apostam na via capitalista. Enquanto o poder do Partido e do Estado está nas mãos do núcleo que segue a via marxista-leninista, os seguidores da via capitalista serão muito poucos e serão expulsos um depois do outro. Impedindo a formação de uma burguesia. Só quando os pró-capitalistas se apoderarem do poder do Partido e do Estado – como na União Soviética – será possível a formação de uma burguesia monopolista e a conversão do Partido numa organização burguesa.”[20]

O imperialismo em crise lança uma ofensiva planetária para reconquistar tanto os países nacionalistas do Terceiro Mundo como os países socialistas, acentuando a exploração dos operários da metrópole.

Um internacionalista estará sempre ao lado dos operários e dos trabalhadores em luta no seu próprio país. Defenderá sempre os movimentos que, no Terceiro Mundo, combatem o imperialismo e a reacção. Apoiará sempre os países socialistas, nos êxitos e nas dificuldades, e aprenderá com as suas vitorias e as suas derrotas. No actual clima triunfalista da direita e do anti-comunismo, é importante dar a conhecer as experiências e os pontos de vista dos países que preservaram a via socialista. Não temos que nos deixar intimidar pela arrogância estupida da direita, devemos antes atrever-nos a defender o socialismo, atrever-nos a defender a China, Cuba, a Albânia ou a República Popular Democrática da Coreia.

Resumindo, os povos, unindo os seus esforços, conseguirão enterrar o imperialismo e a causa do socialismo triunfará.

EPÍLOGO

Os ecologistas e a ofensiva do imperialismo americano

No primeiro aniversário do “movimento democrático” de Pequim, teve lugar na Câmara um debate sobre este acontecimento, em 29 de Junho de 1990. Este debate ensinou-nos, mais uma vez, até que ponto a lavagem cerebral diária dos meios “livres” influenciam os meios que se consideram progressistas. Na sua intervenção, em nome do grupo ecologista Agalev-Ecolo, Xavier Winkel, conhecido pelas suas posturas progressistas, defende a linha seguida pela direita norte-americana. Vendo a maré de mentiras e intoxicações da imprensa “livre”, é compreensível que militantes ecologistas honrados se deixem enganar pelas vozes das multinacionais. Procuramos um debate franco, apoiado por factos indiscutíveis, por documentos e provas. Estamos seguros da nossa causa. A arrogância do imperialismo não nos impressiona, pelo contrário, estamos seguros de que as pessoas que mantêm o espírito lúcido, que não padecem da histeria anti-socialista, se verão obrigadas a reflectir seriamente sobre a correcção de nossa postura, depois de escutar as nossas provas e os nossos argumentos.

Xavier Winkel repete uma tese central do imperialismo norte-americano e europeu, quando reclama “uma continuação das reformas (na China) que tornarão possível a chegada das pessoas aos Estados democráticos”.

No seio do poder norte-americano, bem unido na sua política anti-comunista e de dominação mundial, dividem-se duas tendências tácticas: a facção dominante, representada por Bush e Nixon, quer manter as relações com a China com o objectivo de proteger, apoiar e animar as forças pró-capitalistas no seio do Partido Comunista Chinês. A outra facção predica um anti-comunismo mais aberto e uma táctica mais agressiva para, no prazo mais breve possível, dobrar a China socialista e criar as condições propicias para uma contra-revolução vitoriosa do tipo polaco, romeno ou húngaro. Xavier Winkel defende o programa desta última facção do imperialismo norte-americano. “O que não aceito, disse, é que representantes do governo belga se reúnam com responsáveis chineses.” “A China necessita manifestamente do apoio de outros países e as sanções económicas são eficazes. A Bélgica e os doze devem manter as sanções políticas e económicas” Em resposta, Eyskens disse que a Bélgica “continua a manter uma atitude firme e decidida”. Xavier Winkel respondeu: “estou contente com a resposta do ministro.”[21]

Isto demonstra como gente que se crê progressista, está, as vezes, completamente intoxicada pela propaganda imperialista. O Exército Popular teve que intervir em Pequim para acabar com um motim violento que pretendia derrubar o socialismo; houve trezentos mortos. Xavier Winkel pensa que todo encontro com dirigentes chineses é censurável com o sucedido e que fazem falta sanções políticas e económicas contra este país do Terceiro Mundo que conta com mil milhões de habitantes. Provavelmente Xavier “esqueceu” que o exército norte-americano acaba de cometer uma agressão militar injustificada contra o Panamá, em que foram massacradas entre 5.000 e 7.000 pessoas. O Ecolo-Agalev exigiu que a Bélgica acabasse com todos os contactos com o governo norte-americano e que aplicasse sanções políticas e económicas contra os Estados Unidos? Entretanto, estas medias estariam justificadas já que a causa do imperialismo norte-americano é indefensável. Porém, o Ecolo-Agalev prefere não fazer nada contra o imperialismo norte-americano e continuar repetindo cegamente a agitação anti-socialista que o conjunto das forças imperialistas manipulam desde há muitos anos contra as decisões justificadas da China.


[1] Libération collection, nº 1, Junho de 1989, p.30.
[2] Ibídem, p.37.
[3] Inside Mainland China, Agosto 1989, p.6.
[4] Libération collection, op. cit. p.37.
[5] Ibídem, p.78.
[6] Ibidem, p.78.
[7] The Free China Journal, 15 de Junho de 1989, p.3.
[8] Problems of communism, Setembro-Outubro de 1989, Chinese democracy in 1989, p. 2.
[9] Libération, 3 e 4 de Junho de 1989.
[10] Libération, 5 de Junho de 1989, p.3-4.
[11] Libération, 8 de Junho de 1989, p.2.
[12] FEER, 15 de Junho de 1989, p.12.
[13] De Morgen, 7 de Junho de 1989, p.5.
[14] De Groene Amsterdammer, 11 de Outubro de 1989, p.9.
[15] Libération, 25 de Abril de 1990, p. 36-37.
[16] Sinorama, nº 8, Agosto de 1989, ROC-Taiwán, Shaw Yu-ming, p.51.
[17] The Free China Journal, 26 de Fevereiro de 1990, p. 36-37.
[18] Chen Yun, en Inside Mainland China, Taiwan, Novembro de 1985, p. 19-20.
[19] Issues and studies, Maio de 1989, Student Démonstrations, p.6.
[20] Cidado en AlainBouc: Larectification. Fédérop. Lion, 1977, p.170.
[21] Câmara belga, reunião pública da câmara, 29 de 1990, relatório analítico, p. 1235-1237.



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